O dia 10 de dezembro é o Dia Internacional dos Direitos Humanos, assunto que é a bola da vez. Os recém-concluídos trabalhos da Comissão Nacional da Verdade trazem à tona os acalorados debates políticos sobre o tema. Não pretendo focar esse texto no relatório da CNV, mas sim fazer uma breve discussão mais básica sobre o assunto, mas fundamental. Afinal, o que significa ter direitos humanos? Fazer um texto – curto – sobre isso é certamente um tiro no pé. Corre-se o risco de ser uma mera pregação aos convertidos ou de ser superficial. No entanto, sinto que faltam textos breves que tentem apresentar de maneira mais ou menos clara a ideia geral de um direito humano. É isso que vou tentar fazer, não sei se com sucesso.
Por Daniel Murata Do: brasilpost
Direitos humanos não são direitos “para aliviar a vida dos criminosos”. São direitos cuja finalidade é – paradoxalmente – tornar a vida humana. Isso significa que eles são direitos responsáveis por garantir aspectos que em nossa sociedade consideramos fundamentais. Por exemplo, o direito a não sofrer agressões arbitrárias por parte do Estado e o direito a ser julgado por um tribunal competente são direitos humanos que defendem coisas que julgamos valiosas para uma vida humana digna. Direito à integridade física, à moradia, à participação política. Todos esses são direitos humanos. Trata-se de uma ideia que vai muito além da contenção policial.
Quero fazer duas observações sobre meu parágrafo anterior. Primeiramente, como direitos são gerais, eles valem para todos. Valem para o menino preso no poste no Rio de Janeiro, valem para as vítimas de tortura nas mãos dos militares e valem para você, leitor. Ilustro: imagine que você chega à casa de um conhecido e encontra a porta aberta. Ao entrar, vê seu amigo agonizando no chão, com uma faca no peito. Desesperado, você retira a faca, mas isso provoca uma forte hemorragia que ocasiona na morte de seu amigo. É nesse exato momento que os policiais chegam e se deparam com a seguinte cena: um cadáver, um monte de sangue, e você segurando a arma do crime. O mesmo direito humano a um julgamento por um tribunal, tão criticado por aqueles defensores da “lei e da ordem” e dos “cidadãos de bem” é o que impede os policiais de abrirem fogo imediatamente ao se depararem com essa cena.
Perceber que direitos são gerais é crucial para entender porque direitos humanos são essenciais. Você pode achar que não precisa deles, que eles servem “só para bandidos”, mas a verdade é que sua própria manifestação de desprezo pelos direitos humanos só é possível porque esses mesmos direitos garantem sua liberdade de expressão. No limite, praticamente todas as esferas da vida que consideramos importantes tem alguma proteção graças a tais direitos: moradia, saúde, relações afetivas e familiares. Todos garantidos por declarações… de direitos humanos.
Sobre minha segunda observação, admitidamente, dei uma definição bastante geral de direitos humanos. Fiz isso para evitar entrar em controvérsias acadêmicas sobre qual a fundamentação desses direitos e seu caráter universal. Acredito, aliás, que essas controvérsias são extremamente importantes, mas não me parece que esse texto seja o espaço ideal para reproduzi-las. Faço, no entanto, dois comentários sobre o assunto, porque acredito serem importantes na defesa dos direitos humanos.
O primeiro comentário: direitos humanos – em geral – são justificados a partir da ideia de igualdade humana fundamental. A partir do momento em que reconhecemos que todos os seres humanos são iguais em valor, devemos também reconhecer que eles são iguais em direitos. O fato de alguém ser mais forte, ou mais alto, ou branco, ou heterossexual, ou pertencente a uma maioria religiosa, ou rico, ou pobre é simplesmente irrelevante do ponto de vista dos direitos humanos. Todos são iguais e gozam dos mesmos direitos.
O segundo comentário: quando alguém critica direitos humanos ou defende sua abolição, esse alguém estará negando que algo é importante para a vida das pessoas, ou estará negando que alguma categoria de pessoas tem direitos. Explico: quando alguém acha absurdo o Estado garantir o fornecimento de hospitais e medicamentos públicos, por achar que isso onera o contribuinte, esse alguém está endossando – ainda que implicitamente e muitas vezes sem perceber – o argumento de que ou a saúde não é algo relevante para ser protegida como direito, ou que as pessoas que não podem pagar não tem um direito à saúde.
Concluindo, tentei apresentar, de maneira esquemática e admitidamente problemática, mas clara, a ideia dos direitos humanos e qual a sua importância. Sem alguma compreensão do tema, torna-se impossível debater seriamente suas implicações. Por isso, fica meu apelo àqueles que não se convenceram com meu texto por algum motivo: levem a sério a ideia de direitos humanos. Leiam sobre o assunto, peguem um bom livro sobre o tema antes de criticarem aquilo que muitas vezes é a única defesa que milhares de pessoas têm contra a opressão.
- Geledés
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