terça-feira, 13 de maio de 2014

Os Intelectuais e a Questão Negra no Brasil




   Abordar a questão étnico-racial não é tarefa fácil. O racismo já foi mais escancarado, mais aberto, hoje em dia ele está mais camuflado, escondido, mas não há dúvida que continua a existir, é o racismo institucionalizado. Esse tipo de racismo se apresenta através do preconceito, do comportamento, das atitudes que colocam os negros em desvantagens em relação aos brancos.

   O racismo está presente na sociedade brasileira de forma óbvia, o racismo institucional aparece de várias formas, uma delas é como determinados grupos são tratados de forma diferenciada por instituições públicas e privadas somente por  causa de suas características culturais , físicas e de cor. Na verdade este racismo está embutido em nossa sociedade, tão mascarado que temos a sensação que aqui quase não existe preconceito. E devemos falar também do racismo invertido, que ao contrário do outro tipo de racismo difere desse por ser uma reação a discriminação dos brancos. As desigualdades raciais e de gênero são históricas, envolvem inferioridade e superioridade entre grupos, decorrem muito da escravidão, onde os negros eram tratados como coisas, objetos, sem direitos, propriedade dos homens brancos, existindo apenas para servi-los. Não dá para negar que a raça é um fator de desigualdade, embora se tente camuflar esse fator, negando-se a importância da raça. O Brasil teve a sua formação baseada na escravidão, foi onde surgiram as praticas racistas que ainda hoje continuam  a existir.

   Abordar a questão étnico-racial não é tarefa fácil. O racismo já foi mais escancarado, mais aberto, hoje em dia ele está mais camuflado, escondido, mas não há dúvida que continua a existir, é o racismo institucionalizado. Esse tipo de racismo se apresenta através do preconceito, do comportamento, das atitudes que colocam os negros em desvantagens em relação aos brancos.

       O preconceito racial se solidifica, interioriza-se por gerações, as transformações sociais, a era tecnológica e todo o progresso da humanidade, não são capazes de eliminá-lo. Talvez o preconceito seja algo inerente ao ser humano e prevalece até hoje porque encontra eco, nos teóricos e nos escritos sobre o assunto. Ele continua latente, resistente e nos deparamos com ele a todo o momento.
A teoria de Darwin  assumiu várias formas e interpretações ao longo do tempo, e no Brasil também ocorreu esse fenômeno, indivíduos e grupos se apropriaram do conceito da teoria evolutiva.
     As novas teorias surgiram no Brasil em uma época importante da nossa história, na época da criação da lei do ventre livre, indicando que o caminho do futuro seria com negros livres, mas um futuro que não havia pensado em como  inserir esses homens na sociedade, como aproveitá-los, afinal a que lugar eles pertenciam? O Brasil estava se tornando um país miscigenado e se o branco era, segundo essas teorias, superior ao negro e ao índio, isso acabaria sendo um problema porque tornaria a raça impura, degenerada, o  que não era bom para o progresso da nação, essa era uma teoria defendida por alguns cientistas e teóricos. A teoria de Darwin  assumiu várias formas e interpretações ao longo do tempo, e no Brasil também ocorreu esse fenômeno, indivíduos e grupos se apropriaram do conceito da teoria evolutiva. Podemos dizer que a teoria da evolução de Darwin abre caminhos para que se construa uma nova imagem de miscigenação. A partir dessa teoria evolucionista salientou-se a ideia de que as raças humanas estavam em constante evolução, não estavam estagnadas.

      Partindo desse olhar, acabaríamos por ter uma raça que cada vez mais iria embranquecer, pois a raça branca era superior, assim aconteceria o branqueamento natural da população. Não há dúvida de que o Darwinismo social surgiu para tentar explicar a superioridade de uma raça em relação a outra, essa tese inclusive foi usada por muitos governantes para justificar seus domínios sobre outro povos, considerados inferiores e atrasados, aumentando assim o preconceito principalmente contra os povos asiáticos e africanos. A teoria Darwinista acabou distorcida e convertida em idéias que justificavam a superioridade de alguns segmentos da sociedade em detrimento de outros, por exemplo, ricos superiores a pobres, brancos superiores a negros, o mais forte superior ao mais fraco, uma interpretação que serviu como base para o racismo e o preconceito se espalharem e infelizmente influenciarem o pensamento de grande parte da população.
     Uma das provas de que se queria o branqueamento da população foi a imigração de europeus para o nosso país, recebiam incentivos para vir pra cá, imaginava-se que com o passar dos anos eles conseguiriam branquear a população. As idéias ficam no inconsciente coletivo, fazem parte da nossa história. Não dá para negar que todas essas idéias e teorias influenciaram, e muito, a questão do preconceito racial nos dias de hoje, fomentaram o ódio e a violência, em todos os tipos de racismo existentes. Como foi falado anteriormente o racismo existe de forma velada, mais camuflada, mas ainda existe, o negro sempre foi marginalizado e tratado como ser inferior, a disparidade social e econômica  que existe em relação ao negro só serve para confirmar, o quão distante ainda estamos de uma sociedade livre de preconceitos.

Mariene Hildebrando de Freitas
Advogada, professora e especialista em Direitos Humanos
Email: marihfreitas@hotmail.com



Trabalho escravo no Brasil de hoje

Trabalho escravo no Brasil de hoje

http://www.cartamaior.com.br/?/Editoria/Direitos-Humanos/Trabalho-escravo-no-Brasil-de-hoje/5/1045
Leonardo Sakamoto – 9/12/2003
A escravidão contemporânea é diferente daquela que existia até o final do século 19, quando o Estado garantia que comprar, vender e usar gente era uma atividade legal. Mas é tão perversa quanto, por roubar do ser humano sua liberdade e dignidade. E ela não se resume à terra de ninguém que é a região de expansão agrícola amazônica, mas está presente nas carvoarias do cerrado, nos laranjais e canaviais do interior paulista, em fazendas de frutas e algodão do Nordeste, nas pequenas tecelagens do Brás e Bom Retiro, da cidade de São Paulo. 
A nova escravidão é mais vantajosa para os empresários que a da época do Brasil-Colônia e do Império, pelo menos do ponto de vista financeiro e operacional. O sociólogo norte-americano Kevin Bales, considerado um dos maiores especialistas no tema, traça em seu livro “Disposable People: New Slavery in the Global Economy” (Gente Descartável: A Nova Escravidão na Economia Mundial), paralelos entre esses dois sistemas. 
Antigamente, a propriedade legal era permitida, hoje não. Mas era muito mais caro comprar e manter um escravo do que hoje. O negro africano era um investimento dispendioso que poucas pessoas podiam ter. Hoje, o custo é quase zero - paga-se apenas o transporte e, no máximo, a dívida que o sujeito tinha em algum comércio ou hotel. Além do fato de que, se o trabalhador fica doente, é só largá-lo na estrada mais próxima e aliciar outra pessoa. O desemprego é gigantesco no país, e a mão-de-obra, farta. 
Na escravidão contemporânea, não faz diferença se a pessoa é negra, amarela ou branca. Os escravos são miseráveis, independentemente de raça. Porém, tanto na escravidão imperial quanto na do Brasil de hoje, mantém-se a ordem por meio de ameaças, terror psicológico, coerção física, punições e assassinatos. Ossadas têm sido encontradas em propriedades durante ações de fiscalização, como na fazenda de Gilberto Andrade, família influente da região Sul do Pará. 
Não há estatística exata para o número de trabalhadores em situação de escravidão no país. Estima-se que sejam entre 25 mil e 40 mil, de acordo com número da Comissão Pastoral da Terra (CPT) – órgão, ligado à Conferência Nacional dos Bispos do Brasil, e a mais importante entidade não-governamental que atua nessa área – e da Organização Internacional do Trabalho (OIT). 
A forma de trabalho forçado mais encontrada no país é a da servidão, ou “peonagem”, por dívida. Nela, a pessoa empenha sua própria capacidade de trabalho ou a de pessoas sob sua responsabilidade (esposa, filhos, pais) para saldar uma conta. E isso acontece sem que o valor do serviço executado seja aplicado no abatimento da conta de forma razoável ou que a duração e a natureza do serviço estejam claramente definidas. 
E não é apenas o cerceamento da liberdade que configura o trabalho escravo, mas sim uma série de etapas. Segundo Ela Wiecko de Castilho, subprocuradora-geral da República e professora de direito penal na Universidade de Brasília e na Universidade Federal de Santa Catarina, o processo inclui: recrutamento, transporte, alojamento, alimentação e vigilância. E cada qual com a existência de maus-tratos, fraudes, ameaças e violências física ou psicológica. 
As primeiras denúncias de formas contemporâneas de escravidão no Brasil foram feitas em 1971 por dom Pedro Casaldáliga, na Amazônia. Sete anos depois, a CPT denunciou a fazenda Vale do Rio Cristalino, pertencente à montadora de veículos Volkswagen e localizada no sul do Pará. O depoimento dos peões que conseguiram fugir a pé da propriedade deu visibilidade internacional ao problema. 
Outro exemplo de envolvimento de grandes empresas é o das fazendas reunidas Taina Recan, em Santa do Araguaia, e Alto Rio Capim, em Paragominas, ambas no Pará, pertencentes ao grupo Bradesco, onde, entre as décadas de 70 e 80, foram encontrados trabalhadores reduzidos à condição de escravidão. O governo acaba envolvido indiretamente com o trabalho forçado quando financia empresas que se utilizam da prática. A Superintendência para o Desenvolvimento da Amazônia (Sudam), por exemplo, bancou a Companhia Real Agroindústria e as fazendas Agropalma, também no Pará, pertencentes ao Banco Real, em que foram encontradas irregularidades no início da década de 90. Tudo isso é fruto da política de desenvolvimento adotada durante a ditadura militar, de incentivar os grandes empreendimentos na região amazônica, que fechou o olho para os direitos humanos e trabalhistas. Quem protestava ou reivindicava era preso e torturado. 
Apesar de as convenções internacionais de 1926 e a de 1956, que proibiam a servidão por dívida, entrarem em vigor no Brasil em janeiro de 1966, o país demorou para criar um mecanismo para combatê-la. O que veio a acontecer apenas em 1995, quando foram instituídos os grupos móveis de fiscalização. Essas equipes, coordenadas pela Secretaria de Inspeção do Trabalho (SIT) do Ministério do Trabalho e Emprego, respondem diretamente a Brasília, são acompanhadas de policiais federais e contam com o suporte do Ministério Público do Trabalho e da Justiça do Trabalho. 
O Plano Nacional para Erradicação do Trabalho Escravo, lançado no início de 2003, reúne 76 medidas de combate à prática. Entre elas, projetos de lei como o que expropria terras em que for encontrado trabalho escravo e transfere para a esfera federal os crimes contra os direitos humanos, limitando assim as influências locais nos processos. A implantação do plano tem sido lenta e muitas vezes esbarra na falta de verbas, pressão da bancada ruralista e na incapacidade do governo federal de liberar recursos para aumentar e aparelhar a fiscalização. 
Nos últimos meses, mudanças na legislação tornaram mais duras as penas para quem for pego com trabalho escravo. Outros importante instrumentos foram a determinação da suspensão no crédito agrícola de quem foi condenado pela prática e a criação de 269 novas Varas do Trabalho, a primeira delas a ser instalada em Redenção, sul do Pará. Vale ressaltar que o combate ao trabalho escravo avançou graças à dedicação pessoal dos auditores do grupo móvel do Ministério do Trabalho e Emprego, mesmo com falta de recursos financeiros, equipamentos, veículos que não quebrem em serviço e telefones que funcionem na imensidão verde da Amazônia. 
Mas mesmo fiscalização, multas, prisão dos envolvidos, cortes em linhas de crédito atacam as conseqüências, deixando muitas vezes a causa em aberto. O trabalhador resgatado não vê opções para a sobrevivência e acaba caindo de novo na armadilha. “Com terra para plantar não teria ido embora [da minha terra]. Além disso, pessoa bem estudada não precisa sair, arruma emprego. Os outros têm de ir para o machado mesmo”, afirma um trabalhador libertado. Escravidão no Brasil é sintoma de algo maior: desigualdade. 
“Os trabalhadores que vêm para cá são de locais onde a situação de pobreza é terrível. Se não houver uma política de fundo para gerar emprego e renda e fixar a população nos seus Estados de origem, de nada vai adiantar”, afirma José Batista Afonso, coordenador da CPT em Marabá. Uma efetiva política de reforma agrária, acompanhada de juros baixos para o crédito rural e transferência de conhecimento. Infelizmente, o que vemos hoje é uma grande quantidade de desempregados, reserva de contingente para o trabalho forçado nas regiões de fronteira agrícola.