terça-feira, 6 de dezembro de 2016

A Justiça dos homens


Segundo o Direito Justiça é dar a cada um o que é seu por direito.
            O Dia da Justiça é comemorado no dia 8 de dezembro, em todo o território nacional. Mas o que seria isso? Será que o sentido de justiça é igual para todos? Não existe aí uma grande variação no que entendo por justiça daquilo que você entende?
            Claro que sim. Nada é tão simples nunca. A minha noção de justiça não é isenta das minhas intenções. Cada um tem uma noção do que seja senso de justiça que vai se expressar conforme o discernimento de cada um, o conhecimento e valores éticos e morais sobre justiça. Então temos o conceito genérico de justiça, que tem a concordância de quase todos, e temos o conceito mais particular, com nossas peculiaridades e crenças, menos imparcial.
            Segundo o dicionário Justiça é “a qualidade do que está em conformidade com o que é direito; maneira de perceber, avaliar o que é direito, justo”. O problema é saber qual a coisa certa a fazer. Levando em conta a moral e a nossa consciência, existem certos deveres e princípios que são absolutos. Vou falar aqui da justiça que é feita por pessoas que se acham “justiceiros” da lei, da moralidade e dos bons costumes, achando que podem fazer justiça com as próprias mãos, passando por cima de tudo e de todos em nome da paz e daquilo que qualificam como o certo a fazer.
            O tempo em que a vingança privada  dominava, por conta de falta de leis e de um Estado que realizasse essa função já passou.  A tendência geral é a evolução do homem, do Direito Penal. O “olho por olho , dente por dente” não pode ser a regra. A insatisfação das pessoas e a falta de impunidade que presenciamos diariamente nos faz acreditar que podemos resolver do nosso jeito, baseado na crença de que se o Estado não pune, não faz a sua parte, nós podemos fazer, afinal são tantas as leis e a maior parte não se aplica da maneira como deveria.
            A insatisfação social pela ineficiência do Estado em punir, gera a vontade de fazer justiça com as próprias mãos. Isso se percebe nos linchamentos e casos de vinganças que ocorrem diariamente nos grandes centros urbanos, inclusive em cidades do interior. É verdade que a criminalidade aumenta cada vez mais e isso nos assusta, mete medo, nos causa insegurança e alimenta nossa raiva contra essa situação que se instalou em nosso dia-a-dia. Mas achar que nós mesmos podemos resolver a situação, cometendo atrocidades, fazendo “justiça” não resolve em nada os problemas. O Direito é para todos. As leis são para todos, criminosos ou não.
            A justiça do povo, não é uma justiça baseada nas leis e nos princípios do Direito. A justiça feita pelas próprias mãos é uma autotutela extremamente temerária e danosa porque surge do sofrimento e da dor causada por um filho que foi morto em um assalto, por um pai ou uma mãe que teve sua filha violentada por estrupadores, pelo salário do mês que foi conquistado com sacrifício, ser levado por um assaltante. Surge da descrença nesse sistema que aí está. O pensamento é : Ele tem que pagar o que fez com dor, vamos espancar, linchar, bater para que a lição seja aprendida. Vingança! Vamos vingar o mal feito. E quando a vingança é baseada em suposições? Dai temos um problema ainda maior. A violência não justifica outro ato de violência, mas como seres humanos e, portanto, falíveis, estamos todos sujeitos a cometer um ato desses durante a nossa existência. Para defender quem amamos somos capazes de muitas coisas que nem imaginamos. Isso quer dizer que agimos como animais? Estamos errados em seguir nossos instintos mais primitivos?
            O que não podemos é achar que isso é normal e certo. Voltar a crer na justiça, no Estado, que ele é capaz de nos proteger e de agir. Não podemos acreditar que não precisamos do Estado para cuidar das nossas relações, da sociedade. A ausência de regras e limites nos leva a uma ruptura do pacto social. A sensação de insegurança e impunidade leva o homem a querer punir  aquele que comete o crime, sem respeitar as leis. Esse comportamento tem que ser extirpado da nossa sociedade, devemos priorizar os direitos fundamentais das pessoas e não alimentar o desejo de vingança.
            Clamamos por justiça diante de tudo àquilo que nos causa dor, que perpetua a desigualdade, que abala a nossa moral. Pode estar envolvido interesse pessoal ou não. Lastimamos a injustiça cometida aos outros. Quando  defendemos nosso  direito, estamos salvaguardando o direito de todas as pessoas, reagir a uma ilegalidade ou a uma dor moral ou física que nos aflige através da injustiça nos mostra que ainda nos sensibilizamos e reagimos contra qualquer tipo de violência. Mas a punição não cabe a nós e sim ao Estado, que é responsável por garantir os direitos sociais, preservar e garantir os direitos humanos, a dignidade da pessoa humana.
            A sensação de insegurança e  de impunidade  nos assusta, a falta de leis mais severas também, mas não deve nos tornar brutos,  Sentimos-nos frágeis e  desprotegidos, por conta disso queremos fazer aquilo que é dever e obrigação do Estado, o que é muito perigoso, pois estamos voltando a uma realidade onde a selvageria  e a brutalidade começa a imperar. É a população agindo contra as agressões. É a vingança privada.
            Vamos ficar atentos as regras de convivência. Respeito e tolerância devem andar juntos. Se deve haver um clamor e uma luta, que seja pela agilidade e severidade do Estado em punir. Somos um Estado Democrático de Direito e devemos acreditar nas leis e no poder de punição e de proteção do Estado, sob pena de sofremos um retrocesso que causará uma ruptura social.
Mariene Hildebrando
Professora e especialista em Direitos Humanos

E-mail: marihfreitas@hotmail.com

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